Nova família

Dia 19 de dezembro, o dia que tanto foi adiado e esperando: a primeira troca de família. A semana anterior se arrasstou como nunca, eu estava em humor de louco, além da ansiedade a TPM veio com tudo! Não conseguia parar de comer chocolate, chorava sem motivo e nem tinha ballet pra me liberar a tensão, até ficar sem dormir eu fiquei algumas noites. Me deu até dó dos meus amigos que tinham que aturar minhas lamúrias o dia inteiro.
A noite anterior a troca foi muito mal dormida. Deixei tudo para ser arrumado na última hora, ou na última madrugada. Eu ficava feito louca de um lado para o outro no meu quarto encaixotando coisas, jogando quilos de papel fora e jogando pequenas coisinha em sacolas. Não conseguia entender como acumulei tanta tranqueira em apenas quatro meses! E não fazia a menor ideia como ia levar tudo aquilo para a próxima casa. Quem teve que aguentar o drama dessa vez foi o Daniel, coitado. Eu surtava de um lado e ele tentava me acalmar do outro. Ninguém merece conversar com uma garota histérica à uma da manhã. Quando tudo estava "arrumado" já eram quase quatro da manhã.
Acordei relativamente cedo para o que normalmente acordo quando não tenho aula. Lá estava meu último café da manhã, a última vez qua ia comer aquela granola exageradamente saudável, aquelas vitaminas em cápsulas, aquele iogurte com 0,1% de gordura e água, nada mais. Ia sentir falta daquilo. "último café com agente ein?" meu host pai tentou quebrar o silêncio. "Mhmm..." tudo que consegui reponder.
Mais tarde fomos buscar a árvore de natal. O dia estava lindo, a árvore que escolhemos era linda. Era surreal que eu não veria aquela árvore pronta, era surreal que em uma hora eles não seriam mais minha família.
No carro indo para nova casa eles diziam: Você está muito calada Luiza...
Não conseguia falar, um nó sem igual na garganta, eu sentia a mesma coisa que sento quando deixei o Brasil, mas dessa vez sem a certaza de que iria voltar. Pensei no tanto que mudei e no tanto que eles mudaram.
Minha host irmã era minha segurança e quando ela saiu de casa tudo parecia que ia ser um mártir dalí pra frente, mas foi o contrário depois de um tempo. Meu host pai sempre foi fexado, extremamente exigente, sério e cada movimento errado eu tinha a certeza de que ele iria me cobrar melhoras da maneira mais sincera, e muitas vezes nada simpática, possível. Minha host mãe...nem uso o host mais, ela diz que sou sua filha e ela é minha mãe. Faz tudo por mim e até o meu último segundo na casa ela estava resolvendo minhas pendências. Ela que fez meu novo cartão de ônibus com a nova rota para minha nova casa. Me sentia mais do que em casa ao conversar com eles, já deitava no sofá e comia e conversava até tarde sobre coisas banais. Eles já sabiam do que eu gostava e do que eu não gostava, sabiam da minha vida toda, da vida toda das pessoas no Brasil e já confiavam em mim. Minha host irmã ,mesmo estando raríssimas vezes em casa, já virou uma amiga e tanto. As brincadeiras e risadas dela sempre me faziam sentir melhor. Até de Vester Skerninge eu iria sentir saudades. Odiava o cheiro de curral daquele lugar, odiava ter que ficar 25 minutos no ônibus pra ir para Svendborg, odiava ter que esperar uma hora na estação para pegar o ônibus do fim da tarde, odiava ter que pedalar 20 minutos da minha casa para ter ver alguma civilização, odiava como ventava naquele lugar...mas tenho que adimitir que mesmo nas noites frias que tinha que pedalar eu amava ver a lua e as estrelas refletidas no mar, amava o cheiro da água salgada, amava deitar na ponte e só escutar o barulho da água, amava os campos dourados de trigo que depois ficaram verdes e depois brancos de neve. Amava como aquele lugar conseguia ser cada dia mais bonito.
Então era em tudo isso que eu pensava na viagem de carro.
Chegando na casa nova fui a última a descer do carro. Meus novos pais: Morten e Katja me deram um abraço desajeitado. O filho mais velho de 13 anos, Anthon, me deu um aperto de mão sem graça, Carl-Emil de 10 anos apenas sorriu de longe e o menorzinho de 5 anos se escondeu atrás da mãe. "Não preocupa não galera, eu estou muito mais sem graça que vocês" era só o que passava pela minha cabeça.
Os meninos cochicharam algo pra mãe e ela disse para eu ir com eles. Na porta de um quarto estava escrito LUIZA com um coração, meu novo quarto. Lá dentro um pedaço de cartolina escrito "welcome Luzia" Luzia mesmo, aqui na Dinamarca todos me chamam assim na primeira vez, ou então Louise...Anyways, na cama també, tinha uma super barra de chocolate e um desenho do irmãozinho mais novo.
Fomos tomar chá. Eu e minhas duas famílias. Muito estranho ver as duas alí, meu passado e meu futuro trocando informações sobre mim e passando as instruções de como me tratar.
Depois de um tempo Jørgen veio me abraçar "Já vamos embora, cuide bem de você" ele nunca tinha me abraçado antes. Birgitte estava com lágrimas nos olhos, eu também. Não consegui falar muito. Logo eles sairam da casa e eu me vi alí, sozinha, com aquelas pessoas que nunca ví na vida e deveriam me aturar nos próximos meses...que loucura.
Como estão as coisas agora? Poderiam estar bem melhores se eu tivesse internet, claro, imagine você de férias, em uma casa de desconhecidos, com um frio de -5 graus lá fora, quando todos seus amigos de escola estão em suas respectivas cidades. Imaginou? É isso aí que estou vivendo. Os meninos são fofos, mas as vezes eles temtam se matar e eu não sei o que fazer, e as vezes o do meio fica muito atrás de mim a ponto de eu não poder nem trocar de roupa em paz. Os pais também são uma graça, mas é visível a desorientação deles diante da situação, eles não sabem o que fazer comigo, o que é totalmente aceitável porque eles nunca tiveram intercambista antes e de repente chega uma garota de 17 anos na casa deles.
Então meus dias tem sido assim, fofocando com a mãe alí, fazendo minha unha, vendo muitos filmes de criança, tentando manter os meninos longe das minhas coisa e tentando eveitar que se matem...pois é, vida nova...